segunda-feira, 28 de julho de 2008

Carta n°18

Bento poeta querido!

Que lindo poema escreveste para mim! Como dizemos por aqui: barbaridade,tche!Sabe, Bento, me consta que o poema que te inspirou é de autoria de John Dohne( sec.XVI), e começa por um verso que também ficou célebre: "No man is an island", e foi oportuno demais tu me lembrares disso... Andava eu um tanto "em-mimesmada"(risos), e até meus filhos se ressentiam disso. O teu poema, que noutro momento me inflaria o ego, fez melhor: lembrou-me que sou parte do todo. Ajudou-me a me ver como parcela inerente deste pampa infinito que me cerca e que é o mundo. E assim, me fundiu com o espírito telúrico de minha irmã, que aqui está disseminada pelas suas cinzas sagradas. Bento, li teu poema e saí a correr pela campina, e quase arranquei minhas roupas(tive vontade) como fazia a Alminha. Não o fiz, há sempre algum olhar indiscreto, pensei, e essa é a diferença entre mim e ela, que era uma força da natureza, toda instinto e paixão, aliados à uma mente portentosa capaz de pensar racionalmente na área mais profunda: a do pensamento filosófico. Assim, pobre de mim (risos), não tirei minhas roupas, mas corri, corri até cair exausta e... chorar, chorar de alívio, de amor e afinal de integração com minha irmã, verdadeiro espírito desta terra tão amada. Senti, então uma força, Bento, uma grande força para lutar por esta estância, para salvá-la, para salvar o casarão, o vinhedo, o jardim, o pomar , tudo o que meus olhos e meu coração agora abrangiam, graças ao efeito do teu poema... meu poeta mineiro e telúrico!

Quando voltei ao casarão, ele me pareceu mais claro, mais leve, fui logo abraçar e acariciar meus filhos, tanto, que até estranharam. Patrícia, linda adolescente, que perdeu pai e mãe, ficou com os olhos cheios de lágrimas de emoção e agradecimento, e aninhou-se mais em mim e... fomos uma só. Hans e Christiam meus gêmeos adorados, e Pedrinho, menino terno e sério, pequeno futuro gênio das ciências, também chorou, e me pareceu que pela primeira vez... Mas logo as crianças correram para o jardim, e começaram a brincar como quando eram menores. Me lembrou algo, e então, fui procurar um certo poema da amada Alma, dos sonetos Pampianos que ora envio a ti:

Abro a janela... ( de Alma Welt)


Abro a janela que dá para o jardim
E vejo meus irmãos ali brincando.
Ah! Já começaram, e sem mim!
Voltei à infância, e já me atrazando...

Esperem-me, Solange, Rodo, Lúcia!
E vindos da futura geração
O pequeno Hans e seu irmão
Que parecem dois ursinhos de pelúcia.

Estamos todos juntos... como pode?
Ah!somos crianças novamente!
Pedrinho pede à Pati que o rode

Ao compasso do scherzo de Beethoven
Que o Vati punha alto para a gente
E que os meus ouvidos ainda ouvem...


16/12/2006



Obrigada, pois, Bento, meu querido poeta mineiro.

Beijos da Lúcia

Nenhum comentário: